O início da história da Marinha Mercante se confunde com o início da história da navegação em si. Desde que a humanidade decidiu explorar o mundo através dos mares e oceanos, o homem pratica suas atividades econômicas. Os fenícios navegavam vários dias em barcos precários de cedro em 2000 a.C. para trocar recursos com egípcios e cipriotas. Mas o tempo passou e a tecnologia evoluiu as embarcações, dispositivos e tripulação, e, atualmente, existem navios que transportam 400.000 toneladas de minério de ferro do Brasil para a China em apenas 45 dias.
Apesar dos avanços, existe um fator essencial à navegação que quase não sofreu alterações ao longo dos milênios: as rotas marítimas!
Estas são gigantescos “corredores” com quilômetros de largura que conectam portos, e portanto, as nações. As rotas têm pontos obrigatórios de passagem, “locais estratégicos”, com limitações físicas (costas, ventos, correntes marinhas, profundidade, recifes, gelo) e fronteiras.
Então, o Jornal Pelicano decidiu fazer uma série sobre as principais vias marítimas mundiais. Aqui o leitor irá aprender sobre a geografia, história, curiosidades, dados e, em geral, conhecer a importância destas rotas para a Marinha Mercante.
O primeiro episódio fala sobre uma das mais antigas e importantes vias do comércio mundial: O CANAL DE SUEZ.
O CANAL DE SUEZ
Tido como uma das principais vias do comércio mundial, os números divulgados impressionam. Sua história rica e curiosa – que remete à guerras, reformas bilionárias e grandes nomes da navegação e da História em si – faz justiça à grandiosidade da via, o mais longo canal do mundo.
Mas por que essa rota marítima em particular recebe tanto destaque e glória em relação às outras? Tente responder com as seguintes informações sobre o canal:
HISTÓRIA
Suez é uma cidade no nordeste do Egito, banhada pelo Golfo de Suez (um ramo do Mar Vermelho), cuja principal atividade econômica é portuária.
O interesse em construir um caminho entre os mares Mediterrâneo e Vermelho remonta a 1850 a.C., período em que, segundo estudiosos, os egípcios tentaram, sem sucesso, conectar o Mar Vermelho ao Rio Nilo. Até mesmo Napoleão Bonaparte estudou a possibilidade no fim do século XVIII, mas abandonou o projeto quando seus pesquisadores alegaram – erradamente – que havia uma diferença significativa de altitude entre os mares que se conectariam, o que poderia causar alagamentos e enchentes. Porém, em toda sua extensão, a via está no nível do mar.
Em 1854 somente, Ferdinand de Lesseps, grande empresário e ex-consul francês no Egito, conseguiu negociar com o governador otomano do Egito uma concessão para a construção de um canal com 160 km de extensão até o Mar Vermelho. Cinco anos depois, a Companhia Universal de Suez, empresa do próprio visconde de Lesseps, iniciou a construção da via.
A façanha, envolvendo toda a tecnologia de ponta que havia na época e cerca de 1,5 milhão de homens, custou muito aos governos do Egito e França, que concordaram em financiar o projeto.
Dia 17 de novembro de 1869 (quatro anos após o prazo), o canal era inaugurado.
Em consequência de uma dívida externa, a partir de 1875 o Egito doou sua parcela de posse da via aos britânicos que demonstravam grande interesse na via e, durante uma ocupação em 1882, tomaram o controle total do canal, permitindo apenas a passagem de navios britânicos ali. Em 1888, porém, a Convenção de Constantinopla declarou o Canal de Suez como zona neutra sob controle da Grã-Bretanha, ou seja, mesmo em períodos de guerra, embarcações de todas as nações poderiam trafegar por ali.
E assim permaneceu, mesmo durante a Primeira Grande Guerra e outros menores conflitos na região até o fim da Segunda Guerra Mundial. Após insistência do governo egípcio para reaver o controle da via, em 1956 os britânicos retiraram suas tropas das margens do canal, e, após alguns meses de relação internacional turbulenta (envolvendo principalmente Israel), em março de 1957 uma empresa estatal egípcia passou a controlar a via, permanecendo até os dias atuais. Dez anos depois, o canal foi fechado em consequência da Guerra dos Seis Dias entre Egito e Israel. Permaneceu fechado até 1975, quando um cessar fogo foi negociado. Com a exceção desse período da Guerra dos Seis Dias e graças à um acordo com a ONU, desde 1957 navios de quaisquer países podem navegar por ali.
Durante todos esses anos, a via sofreu uma série de pequenas alterações até que, em 2014, a empresa que administra o canal anunciou uma grande reforma. Ampliando trechos já existentes e construindo um trecho totalmente novo de 35 km paralelo ao caminho principal, a obra permitiria um maior fluxo de embarcações ainda maiores. Custando cerca de US$ 8,5 bi aos cofres egípcios, o novo Canal de Suez foi entregue (em menos de um ano e dentro do prazo) em 6 de agosto de 2015.
GEOGRAFIA
Situado no território egípcio, a via conecta o Mar Mediterrâneo ao Mar Vermelho, sendo a travessia mais curta entre os grandes portos do Pacífico ocidental e do norte africano/sul europeu. Supondo que uma embarcação viesse da Mediterrâneo e desejasse atravessar o canal, entraria pelo porto Said e passaria, entre outras coisas, sob uma ponte cartão-postal egípcia, pela maior ferrovia giratória do mundo, pelo Lago Timsah, pelo Grande Lago Amargo, pelo Pequeno Lago Amargo e sobre um túnel rodoviário para navegar até o Porto de Suez, na outra extremidade do canal.
Antes da construção do canal, a travessia precisava ser feita contornando o Cabo da Boa Esperança (conhecido por seu clima adverso) no sul da África. A diferença de uma viagem de Mumbai, na Índia, até Londres, na Inglaterra, é de aproximadamente 8000 km e/ou 15 dias navegando.
DADOS
Após a obra, o canal mede 193,3 km de uma ponta a outra, possui calado (profundidade) de até 24 m e largura (medida onde o calado é de 11 m) entre 205 e 255 m. A cada 125 m, há uma estrutura para amarração onde navios podem atracar de forma segura em caso de emergência.
Embarcações de até 15 m de calado e/ou 70 m de boca (largura) e/ou 240 mil toneladas de porte bruto podem navegar com segurança no canal, e atendendo condições especificas, até mesmo embarcações maiores. Um navio consegue cruzar, em média, toda a extensão em cerca de 18 horas, mas o tempo médio de espera na fila para a travessia é de 11 horas.
O canal recebeu em 2013 cerca de 14% do fluxo marítimo mundial e mais de 15000 navios. No mesmo ano, cerca de 4,6% da produção de óleo do planeta passou pelo Canal de Suez e pelas tubulações SUMED (rede de óleo vizinha ao canal). O governo egípcio (que administra o canal), teve lucro de cerca de US$ 5 bi em tarifas naquele mesmo ano. Com a obra de ampliação, a expectativa – até 2023 – é quase dobrar a quantidade de navios navegando (de 49/dia para 97/dia), diminuir o tempo de espera para entrada no canal (de 11 horas para 3 horas) e aumentar ainda mais os lucros (de US$ 5 bi para US$ 12,5 bi).