2OM Mayle Peres (Foto: Acervo pessoal).

A 2º Oficial de Máquinas (2OM) Mayle do Nascimento Peres, de 31 anos, se formou pela Escola de Formação de Oficiais da Marinha Mercante (EFOMM) em 2009 e praticou, em 2010, pela Maesrk, durante 1 mês no offshore, tendo concluído, porém, o restante do seu estágio obrigatório embarcado, na cabotagem, pela Mercosul Santos. Trabalhou em 3 empresas e, ao final de sua praticagem, foi para a Bravante (antiga PetroSantos – dezembro 2010/março 2013). Hoje, Mayle embarca pela Farstad.

JORNAL PELICANO – Atualmente, sabemos que o preconceito existe em todos os lugares e vem de todas as partes. Você sofreu algum tipo de preconceito no trabalho por ser mulher?

MAYLE PERES – Já embarquei num navio em que sofri preconceito por parte de um Oficial de Máquinas, por ele achar que mulher não pode desempenhar certas funções, e fui colocada para trabalhar no Centro de Controle de Máquinas (CCM), sem poder trabalhar na Praça de Máquinas.

JORNAL PELICANO – Qual comportamento, adquirido pelo convívio na EFOMM, você pôde aplicar no ambiente de trabalho?

Você deve saber que todos são importantes, desde o comandante até o taifeiro, pois cada um desempenha seu trabalho de forma a complementar o outro.

MAYLE PERES – Companheirismo. Você deve saber que todos são importantes, desde o comandante até o taifeiro, pois cada um desempenha seu trabalho de forma a complementar o outro. Você não precisa ser amigo de todos, mas sim respeitar a função do outro. Isso é o mais importante e você aprende passando pelas experiências que passa na EFOMM.

JORNAL PELICANO – Como é a rotina a bordo? Qual o salário e qual a frequência da folha de pagamento?

MAYLE PERES – Depende da empresa e da embarcação. Vou contar a minha experiência de offshore, porque depois que virei Oficial só embarquei por offshore: Nós revezamos 6/6 (Farstad), mas depende também da Praça de Máquinas, se ela fica desguarnecida ou não. A questão de salário depende da empresa, mas atualmente, na nossa posição, varia de 8000 até 14000 reais (líquido), depende também se a empresa é brasileira ou se é estrangeira.

JORNAL PELICANO – Qual foi seu critério de escolha para essa profissão?

MAYLE PERES – Na época, eu escolhi “no escuro” por falta de orientação, então cursei Máquinas por achar que era parecido com engenharia.

Atualmente, a Sociedade Acadêmica da Marinha Mercante (SAMM) promove iniciativas, como a II Semana da Profissão, para auxiliar o aluno do primeiro ano a escolher sua futura especialidade.
Confira as reportagens do link II Semana da Profissão 

JORNAL PELICANO – Qual foi sua maior dificuldade a bordo?

MAYLE PERES – Meus embarques sempre foram tranquilos. Porém, não me agradava embarcar com tripulantes de algumas nacionalidades em especial, por questões culturais, porque a maioria deles não vêem a mulher fazendo certos tipos de trabalho, além dos comportamentos tradicionais de cada povo; foi um choque cultural muito grande.

Algumas colocações:

MAYLE PERES – Você perguntou sobre minha maior dificuldade a bordo, só que a maior dificuldade da minha carreira não foi embarcada, foi quando eu engravidei. Tinha saído um acordo coletivo alguns meses antes de eu engravidar e nele falava sobre a gestante – a gestante receberá remuneração integral durante o período de gestação – mas a empresa na época não entendeu essa cláusula. Eu passei por muita humilhação, a médica não me liberou para eu embarcar e não sabiam o que fariam comigo, não sabiam se iriam suspender meu contrato. Eu fiquei numa tristeza muito grande porque eu me senti culpada de ser mulher e estar grávida, mas no final de tudo, com a ajuda do sindicato, eu consegui trabalhar no escritório da empresa, embora tivesse sido colocada numa função de tirar xerox. Eu passei 7 meses tirando xerox. Então isso me marcou, eu me senti desmerecida. Eu acho que é bem importante para as meninas procurarem saber sobre isso.

JORNAL PELICANO – Como é o ambiente de trabalho de um maquinista? O que mais incomoda e o que mais te satisfaz?

MAYLE PERES – Não tem como florear muito. É um ambiente quente, barulhento, insalubre, é sujo… o que mais me incomoda é isso, só que ao mesmo tempo os maquinistas se dão bem entre si e com os outros, geralmente são pessoas que tem um bom relacionamento, além de ser um ambiente mais descontraído. Eu acho muito legal quando você faz uma manutenção, você resolve o problema. Te dá orgulho saber que foi a responsável pelo conserto.

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Mayle e seus colegas de trabalho na praça de máquinas (Foto: Acervo pessoal).

JORNAL PELICANO – A comunicação é um problema a bordo? Você possui acesso à internet?

MAYLE PERES – Não [é um problema], mas depende da embarcação e da empresa; por exemplo: quando embarquei numa embarcação asiática, eles queriam cortar custos, então cortaram a internet. Porém, pela Farstad (empresa atual), a comunicação não é problema, possuem internet e telefone.

JORNAL PELICANO – Como é a segurança e o conforto na vida a bordo?

MAYLE PERES – Tudo que você perguntar depende muito da empresa e do tipo de nacionalidade da embarcação. Na Farstad o padrão é norueguês. Eles prezam pelo conforto, o camarote é espaçoso, tem academia a bordo, os espaços de convivência são bons; pelas experiências de embarque, algumas empresas prezam pelo conforto, outras pelo custo.

JORNAL PELICANO – Para o maquinista, qual a diferença entre navegação de longo curso, de cabotagem e offshore no que diz respeito ao ritmo de trabalho e ao salário?

MAYLE PERES – Pelo que eu pude ver na Cabotagem, geralmente o maquinista tira 4/8 e a praça de máquinas é desguarnecida. Você pode tirar um serviço de 0700 às 1600 ou de 0800 às 1700, depende muito do chefe e de suas diretrizes. No caso do offshore, a rotina é um pouco mais reduzida. Quanto ao salário, o da Cabotagem é um pouco abaixo do offshore, girando e torno de 7000 a 8000 reais. O ritmo de trabalho para o maquinista é praticamente o mesmo.

JORNAL PELICANO – Quem determina o período embarcado, a empresa ou o praticante?

MAYLE PERES – No meu caso foi negociável, eu acabei pedindo pra empresa pra ficar além do tempo determinado e eles aceitaram; mas com alguns amigos meus, o tempo estipulado foi mais certo.

JORNAL PELICANO – Praça de máquinas desguarnecida à noite afeta o mercado de trabalho?

MAYLE PERES – Não, porque há um controle sobre a Máquina, e quando o alarme soa, o número de pessoas que tem que ter a bordo independe se ela é desguarnecida. No caso de operações, uma embarcação de AHTS, de ROV, a praça de máquinas tem que estar sempre guarnecida.

JORNAL PELICANO – Como a língua estrangeira influência na profissão?

MAYLE PERES – O inglês é fundamental, você tem que saber mais o inglês do que sua própria língua, porque você não sabe com qual tipo de tripulação vai embarcar, então você tem que se fazer entender.

JORNAL PELICANO – Como você lida com os relacionamentos pessoais: família, amigos, filhos, namorado?

 MAYLE PERES – Eu sou casada e tenho uma filha. Meu marido é Imediato, e quando você está com pessoas que trabalham na mesma área que você, tudo é mais fácil de entender e a gente tem uma escala próxima. Quando eu vou embarcar, eu deixo minha filha com meus pais; a saudade é grande, mas se eu trabalho muito é por causa dela. Eu acho que poucas profissões dão a oportunidade que a gente tem de dar o melhor para nossa família, então eu sou muito grata a minha profissão.